Ritual do Awê

Ritual do Awê


O ritual do Awê é o único considerado “coisa dos antigos”. É “algo que sempre existiu e que nem os avós dos velhos sabiam dizer quando começou [...]. Parece que quando se fazia um Awê antigamente era uma única música/dança o tempo todo. Mas fazer um Awê é uma expressão que hoje [se] refer[e] a contextos diferentes de festas [...] engloba um conjunto bem variado de coreografias, cada qual com um sentido determinado” (Grunewald, 1999, p. 251). O Awê requer cauim e, eventualmente, aluá, uma bebida fermentada de grãos de milho moidos ou cascas de frutas, como o abacaxi, entre outras.
Por outro lado, a existência do Toré, entre os Pataxó, sempre foi negada: “O Toré é do norte, não é nosso”. Alguns, a exemplo do pajé Manoel Santana, reagem, muito negativamente, à possibilidade de admissão dessa prática, sob o argumento de que “não pode copiar isso aí, não, que não é nosso, quando o pessoal do norte chegar, nós vamos passar vergonha e não pode cantar isso lá. Cada um representa o que é seu. Representar o que é dos outros?”.
Os rituais indígenas, no contexto etnográfico do Nordeste, têm um forte acento sobre o seu caráter privado, sob a forma do “segredo”. É comum, pois, a referência a um Toré passível de ser compartilhado com assistentes não indígenas, e um outro, privado, cuja participação constitui uma prerrogativa exclusiva dos índios. O Awê dos Pataxó estabelecidos no extremo-sul baiano parece enfatizar a expressão pública, ao contrário do que tem sido observado em relação ao Toré, considerado por eles como sendo “dos índios do Nordeste, mais lá para cima”. Sandro Campos Neves observa, contudo, que o Awê em Coroa Vermelha é apresentado tanto no contexto público como em contextos íntimos e exclusivos, tais como em comemorações de retomada de terras ou celebrações na Reserva da Jaqueira (Neves, 2012, p. 155).descrição de Grunewald, o líder Nelson Saracura acredita que os índios da Coroa Vermelha estão “resgatando uma cerimônia antepassada”, mas que esse resgate não pode ser mostrado ao não indígena, “porque tem que ter um segredo do ritual, o segredo é a segurança, um segredo é a resistência de nós como área indígena”. Assim, Saracura afirma que a comunidade da Coroa Vermelha tem pretendido representar as “duas partes”, ou seja, tanto o Awê (proveniente de Barra Velha) quanto oToré (oriundo da Reserva Indígena Paraguassu-Caramuru, onde residem, dentre outras etnias, osPataxó HãHãHãe, ou Pataxó setentrionais) (Grunewald, 2008, p. 261). A afirmação de Saracura deve ser, contudo, relativizada, pois se trata de um Kariri-Sapuyá – uma das etnias estabelecidas, desde os anos 1938, naquela reserva – que, muito provavelmente, é favorável à união das duas ramificações pataxós. Já entre os Pataxó de Carmésia (Minas Gerais), registros apontam para a presença de um ritual que obedeceria a um padrão geral mais próximo do Toré (Grunewald, 2008).
No que diz respeito à relação entre os Pataxó da Bahia e de Minas Gerais, são comuns viagens empreendidas por representantes do movimento de mobilização cultural provenientes de Coroa Vermelha e Barra Velha, para Minas Gerais, no intuito de compartilhar tradições pataxós. Periodicamente, pesquisadores da língua Patxohã das duas aldeias acima mencionadas se deslocam para as demais, incluídas as de Minas Gerais, para realizar cursos de reciclagem aos professores, visando não apenas a troca dos conhecimentos produzidos, mas a garantia, de acordo com os seus próprios argumentos, da “unidade” de sua identidade (Miranda, 2009).





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